Publicado em 16/09/2020 às 09:49, Atualizado em 16/09/2020 às 14:06
A Reforma Administrativa do serviço público é composta por várias etapas e alterações normativas, sendo o Projeto de Emenda Constitucional nº 32/2020 a principal mudança deste momento. Neste texto abordaremos com maior ênfase a situação dos atuais servidores, visto que a mídia nacional vem dando enfoque maior às mudanças relativas aos novos servidores (ou futuros servidores), surgindo a necessidade de esclarecer a falácia de que a reforma não atingirá os servidores que ingressaram no serviço público antes das mudanças almejadas pelo Governo Federal.
Inicialmente é preciso fixar uma premissa que é cristalina mas que muitos têm dificuldade de enxergar: O objetivo principal é cortar “gastos” com servidores a Curto Prazo.
Essa é a conclusão que se extrai ao interpretar os seguintes fatos, resultado de inúmeras alterações constitucionais e legais recentes:
- Há anos a aposentadoria dos servidores que ingressarem ao serviço público encontra-se limitada ao teto do INSS;
- As alíquotas foram majoradas, sendo que os servidores aposentados são os únicos trabalhadores que continuam a pagar previdência mesmo após sua entrada na inatividade;
- Foi criado um teto de gastos públicos com vigência de 20 anos, que proíbe o aumento de gastos acima da arrecadação (Emenda Constitucional n.º 95/2016)
- Está em vigência a proibição de reajustes e criação de benefícios até 31/12/2021 (Lei Complementar n.º 173/2020), sendo que mesmo antes dessa proibição a imensa maioria das carreiras encontra-se com os salários congelados há quase uma década;
- Na maior parte dos órgãos públicos a reposição de servidores vem sendo realizada em número inferior ao de aposentadorias e inferior ao aumento do volume de trabalho;
Desta forma, se nada for alterado na legislação dos servidores públicos, de qualquer maneira já haverá significativa diminuição de gastos no decorrer dos anos. Entretanto, como fica nítido, os governos e o mercado querem ainda mais, e querem rápido!
A grande mídia e os agentes do mercado sempre demonizaram o serviço público perpetuando a falsa imagem dos “marajás”, quando na verdade não precisa procurar muito para se verificar que maior parte dos servidores têm salários muito baixos, em sua maioria no âmbito municipal. A diferença deste momento em que vivemos é que não sequer fingindo um combate aos “supersalários” (compostos muitas vezes por gratificações, adicionais e verbas indenizatórias questionáveis, muitas vezes de forma retroativa), agora o governo escancarou que pretende, na verdade, manter privilégios e atacar os salários mais baixos do funcionalismo público, como na fala do Ministro Paulo Guedes: Clique Aqui!
Em relação aos servidores públicos atuais, que não fazem parte da casta protegida, é preciso lembrar de uma lição básica de Direito Administrativo: não existe direito adquirido a regime jurídico-funcional, ou seja, um novo plano de cargos e carreiras será aplicado da sua vigência em diante a todos os servidores, resguardando apenas o direito adquirido até o fim da legislação anterior, inexistindo valor jurídico para a mera expectativa de direito de quem futuramente atingiria requisitos para obter direitos previstos na Lei revogada. Em outras palavras, uma vez alterada negativamente a forma de progressão e promoção na carreira, tais regras serão aplicadas a todos dali em diante.
No âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul, especificamente, a reforma elimina por inteiro o alicerce da carreira, qual seja, as progressões funcionais (biênios) e o adicional por tempo de serviço (quinquênios), modalidades repudiadas pela reforma por serem formas de melhorias salariais automáticas baseadas exclusivamente em tempo de serviço. Portanto, os servidores do TJMS seriam afetados diretamente tendo que lutar por reconstruir um plano de cargos e carreiras. Sem mencionar o abatimento de eventuais dias de recesso dos 30 dias de férias anuais e mais restrições de direitos em casos de afastamentos e licenças. Sendo a possibilidade de “retirada” do servidor cujo cargo seja considerado obsoleto a modificação mais alarmante, porquanto estamos numa época de novas tecnologias com a inteligência artificial cada vez mais avançada que torna essa possibilidade extremamente concreta e palpável, talvez até iminente.
Não bastasse esse futuro prejuízo financeiro, que poderia ser apenas mais um dos inúmeros prejuízos sofridos nos últimos anos, o maior perigo reside na intenção oculta dos agentes do mercado e dos governos, que não é de apenas diminuir o salário dos novos servidores (diante da irredutibilidade salarial dos atuais servidores), mas sim fazer essa “troca” o mais rápido possível, mediante a Demissão dos atuais servidores, viabilizando assim, a rápida contratação em larga escala de novos servidores e/ou a terceirização (privatização) de seus serviços.
Para atingir esse objetivo que, apesar de velado, é possível de ser evidenciado com um pouco mais de atenção, sequer é necessário realizar uma alteração na Constituição Federal, bastando tão-somente Regulamentar o seu artigo 41, § 1º, inciso III, que trata da Perda do Cargo Público do Servidor Estável, Mediante Procedimento de Avaliação Periódica de Desempenho, Na Forma de Lei Complementar, assegurada ampla defesa.
A ideia infalível é de divulgar que se pretende avaliar o desempenho dos servidores públicos constantemente, disfarce que terá forte apoio popular até entre os próprios servidores na caça e expulsão dos servidores que sejam considerados “preguiçosos” e na louvável intenção de dar maior efetividade aos serviços públicos, contudo, como se sabe, a diferença entre um remédio e um veneno é apenas a dose, portanto, basta serem insedas metas subjetivas e/ou inatingíveis para se alcançar o objetivo de estourar a granada no bolso dos servidores públicos estáveis, abrindo caminho para a privatização e novas contratações com menores salários e direitos, satisfazendo os anseios dos agentes do mercado, implicando também, na diminuição da qualidade do serviço público.
Caso ainda assim o servidor supere eventuais avaliações periódicas, todo seu esforço será irrelevante caso seja declarada a obsolescência das suas atribuições, sendo descartado do serviço público como se fosse um objeto que perdeu a relevância após inovações tecnológicas.
Diante disso, servidor público estável, a segurança do seu cargo está sob grave risco! Não aceite isso passivamente, Lute, pois esta batalha será até mais difícil do que a enfrentada quando da sua busca por aprovação no concurso público alcançado pela verdadeira meritocracia. Não somos parasitas, não somos privilegiados e posicionar-se é um dever! Lembrando Martin Luther King: “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons”. Não sejamos inertes, aceitando a subjugação pelos poderosos; sejamos, pois, aguerridos na luta por nossos direitos!
Informem-se e unam-se, só assim vamos vencer essa luta em defesa do serviço público de qualidade para toda a população brasileira.
Por; Leonardo Barros de Lacerda / Presidente do SINDIJUS-MS