A morte do bebê Rodrigo Moura Santos, de apenas um ano e meio de idade, em Dourados, teve diferentes versões apresentadas à Justiça desde aquele fatídico 16 de agosto de 2018. As mais recentes, fruto de depoimentos prestados pelos acusados e por testemunhas durante audiência de instrução e julgamento realizada dia 13 de fevereiro deste ano, narram lesões supostamente provocadas por quedas de quem está aprendendo a andar, engasgamento com alimento e até indícios de maus tratos.
Conforme já revelado em despacho proferido no dia 14 passado o juiz Eguiliell Ricardo da Silva determinou que Joel Rodrigo Avalo dos Santos, de 25 anos, e Jéssica Leite Ribeiro, de 21, sejam submetidos ao julgamento pelo Tribunal do Júri em Dourados. Pai e madrasta da vítima, os dois são acusados de homicídio qualificado por emprego de meio cruel e figuram como réus de crime cometido numa casa na Rua Presidente Kennedy, no Jardim Márcia.
Antes de considerar que “há indícios suficientes de autoria que recaem sobre Jéssica, e no tocante a Joel, é imputada participação por omissão, já que, em tese, o genitor teria o dever de agir consistente na obrigação legal de cuidar, proteger ou vigiar o filho, em decorrência do poder familiar”, o magistrado da 3ª Vara Criminal leu a denúncia oferecida pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual) e ouviu os relatos.
Madrasta
Presa no Estabelecimento Penal Feminino de Corumbá, Jéssica é acusada pelo crime. Por meio de videoconferência, afirmou ao juiz que no dia dos fatos, logo após Rodrigo e a irmã, seus enteados, acordarem, foi preparar a mamadeira e colocou a vítima em uma bancada. Detalhou que para distrair a vítima, deu-lhe uma sacola e em dado momento a irmãzinha puxou a sacola e derrubou o bebê, o que causou um ‘galo’ em sua cabeça.
Jéssica acrescentou “que pegou Rodrigo e colocou a chupeta em sua boca, a fim de que ele cessasse o choro” e “que a vítima fazia muita força, dando a entender que quisesse defecar”. Disse ainda ter pedido “para que a menina apertasse a barriga do irmão, “sendo que esta ficou em pé na barriga dele, momento que a acusada disse para a irmã descer”. A acusada disse que “massageou a barriga da vítima e levantou-se para pegar um óleo de azeite, quando então a menina lhe alertou que a vítima havia vomitado. Disse que pegou a vítima no colo e começou a apalpar para ver se ainda tinha respiração e ao notar que não havia mais, chamou a sua mãe e disse que a vítima estava passando mal, e foi alertada para ligar para o Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência]”.
Aprendendo a Caminhar
A madrasta de Rodrigo afirmou que “assoprou a boca da vítima”, na tentativa de reanima-lo. Apontou ainda que quando o Samu chegou já lhe informou que a vítima estava sem vida e “que a irmã da vítima subiu apenas uma vez na barriga da vítima”. Também pontuou “que somente viu o ‘galo’ que se formou na cabeça” e “que somente apertou o pescoço da vítima quando pegou ele para erguer e reanimar, porque acreditava que a vítima estava engasgada e foi nesse momento que se deram os arranhões”.
Jéssica negou que tenha agredido ou maltratado a vítima por outras vezes e afirma que tinha a vítima como filho. Também “que o acusado Joel não estava em casa e relata que a vítima tinha algumas escoriações em razão de que estava aprendendo a caminhar”.
Pai
Preso na PED (Penitenciária Estadual de Dourados), Joel, pai de Rodrigo, negou ter sido omisso quanto aos cuidados do filho. À Justiça, disse que “a vítima estava em sua residência há aproximadamente uns 15 dias” e “que era comum a vítima e a irmã ficarem na sua casa”.
Questionado sobre as lesões em antigas apontadas pela perícia, “o réu disse que a vítima tinha apenas uma mancha na testa no dia anterior aos fatos, sendo que lhe foi informado que a irmã da vítima havia lhe empurrado” e “que nunca presenciou a acusada bater ou maltratar as crianças”.
Rezava
Em seu depoimento, Joel afirmou “que a vítima tinha problema de defecar, e sempre faziam massagem na vítima, contudo as massagens na barriga sempre se davam com muito cuidado” e “que sua sogra lhe telefonou e disse que a vítima havia ‘gorfado’ e estava muito mal”.
Joel disse que se dirigiu até a residência “e encontrou a vítima já sem vida, contudo pegou a vítima no colo e rezava para que estava voltasse” enquanto o Samu estava do lado de fora do imóvel. Finalizou afirmando “que não visualizou anteriormente nada de diferente em questões de lesões no corpo da vítima”.
Socorrista e Perito
Outro depoimento foi de um socorrista do Samu, que relatou ter recebido a informação de uma criança engasgada, razão pela qual “se deslocou ao local e chegando lá deparou-se com a vítima no colo da madrasta, ora acusada”. Detalhou “que a acusada mudou sua primeira versão (engasgamento), dizendo então que a vítima apresentou uma crise compulsiva (sic)”.
Ele ponderou, porém, que “analisando todas as lesões, deu-se conta que não se tratava de ocorrência clínica (sem violência), mas sim de ocorrência traumática (provocada)”, e “que o acusado chegou transtornado no local, sendo que adentrou e não saiu mais de lá”. O socorrista relatou ainda ter verificado “que haviam lesões pré-existentes na vítima”.
Maus Tratos
Já o perito responsável pelo laudo necroscópico “relatou que a vítima tinha vários coágulos, alguns deles possivelmente pré-existentes ao evento que causou a sua morte”. Sobre as lesões das unhas no pescoço do bebê, disse que “ao fazer o exame necroscópico, não havia nenhum sinal de comida ou leite que pudesse ensejar engasgamento” e “que a vítima faleceu de laceração hepática causado por energia cinética (força)”.
Acrescentou ainda “que as lesões eram agudas e tardias, inferindo haver vestígios de maus tratos anteriores à criança”.
Vizinha
Uma vizinha declarou que “estava em sua residência quando ouviu barulhos ao lado de fora e ao sair recebeu informações de que a vítima estava passando mal” e “que se dirigiu até a residência e se deparou com a vítima deitada em um colchão e a acusada Jéssica ao lado”.
Acrescentou “que ouviu terceiros dizerem que a vítima estava engasgada, e então colocou o dedo na garganta na tentativa de desengasgar”. Detalhou ainda ter segurado a vítima no colo e achado que ela estava apenas desmaiada. “Somente alguns minutos depois se deu conta que ele já estava sem vida” e “indagou Jéssica sobre as lesões no pescoço, sendo que esta disse não saber como havia feito aquelas lesões”.
Mães
A mãe de Jéssica disse que a acusada “sempre aceitou os filhos do acusado e cuidava bem deles”. Acrescentou “que no dia dos fatos estava para sair de casa quando a acusada abriu a janela e pediu que viesse ver como a vítima estava”.
Afirmou que sua filha nada dizia, “pois encontrava-se em estado de choque” e que foi procurar ajuda na rua, sendo que a vizinha foi ver a vítima. Da filha, ouviu a mesma versão prestada no depoimento judicial.
A mãe de Rodrigo afirmou que sua filha, irmã da vítima que vivia com o pai e a madrasta, afirmou ter presenciado os fatos e que a “tia Jeca tampou a boca e apertou a barriga da vítima”. A menina acrescentou que a acusada ficou brava porque Rodrigo estava chorando e que a acusada subiu em cima do bebê.
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