Recentemente ganhou bastante repercussão um caso de um condenado por tráfico de drogas preso em flagrante com 267 kg de maconha. O motivo do destaque foi a absolvição do acusado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Naturalmente, surgiram diversos questionamentos da população, razão pela qual o presente artigo busca, de forma clara, explicar o porquê dessa absolvição.
Antes, porém, um breve resumo de como se deu o contexto do caso: o motorista, que conduzia o veículo na rodovia, foi abordado pela polícia, mas nada de ilícito foi encontrado. Ainda assim, os agentes desconfiaram que o acusado fosse um batedor do tráfico de drogas (o batedor é o responsável por ir, geralmente, na frente do veículo que está com a droga, com o objetivo de avisar o comparsa se houver alguma blitz ou fiscalização policial). Em razão da preocupação, os policiais levaram o acusado para a base, momento em que o celular deste tocou. O policial, então, atendeu, se passou pelo acusado e manipulou o comparsa. Após a conversa, o outro veículo foi abordado, onde encontraram os entorpecentes e realizaram a prisão em flagrante.
Vamos a explicação de como e porque o motorista foi absolvido.
Em primeiro lugar, é preciso destacar que todos nós – do porteiro ao Presidente –, temos o direito ao sigilo das comunicações telefônicas. Dessa forma, não se pode, sem motivo razoável e justificado, interceptar uma ligação ou até mesmo ler as mensagens de alguém sem autorização da própria pessoa.
Esse direito ao sigilo está previsto no art. 5º da Constituição Federal e é, portanto, uma cláusula pétrea.
No caso que resultou na absolvição, o policial, ao atender o telefone e se passar pelo acusado, violou o sigilo das comunicações, contrariando, assim, a Constituição Federal.
Alguns podem indagar: “Mas depois descobriram a droga. Isso não válida o comportamento do policial?”
A resposta é não. Isso porque não se admite a devassa em direitos fundamentais a fim de tentar achar alguma prova contra quem quer que seja. Em outras palavras, a polícia não pode “passar por cima da lei ou da constituição” para tentar descobrir quem fez ou o que fez. É preciso saber respeitar as regras do jogo.
No caso, no momento em que o policial atendeu a ligação e se passou pelo acusado, não havia nenhum indício de crime, nenhuma prova ou elemento que pudesse validar a atitude do agente de segurança. Logo, se tratou da popular expressão “chute no escuro” a fim de buscar algo desfavorável.
Contudo, tal conduta não é permitida. Para que algum direito – seja ele do porteiro ou do Presidente – seja deixado de lado, é preciso que haja motivos suficientes.
O mesmo ocorre quando policiais “arrombam” a porta em busca de alguma ilegalidade dentro da residência. Quando isso acontece, viola-se a inviolabilidade de domicílio. É preciso que se tenha fundamentos que demonstrem o cometimento de crimes no interior do imóvel, pois, caso contrário, ainda que encontrem drogas ou quaisquer outras provas, elas não serão válidas, em razão da violação ao domicílio da pessoa.
No caso analisado, note-se que a apreensão dos entorpecentes só foi possível após o policial atender a ligação e se passar pelo acusado, ou seja, após a violação ao sigilo das comunicações do acusado, razão pela qual a apreensão das substâncias foi declarada ilícita, resultando na absolvição.
(*) Vinícius Rodrigues é advogado criminalista formado pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), Pós-graduado em Direito Penal Econômico pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG) e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). -
Credito: Campo Grande News
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