MS: Carrefour é condenado a pagar R$ 400 mil por assédio moral organizacional

Atuação teve início com recebimento de denúncia baseada em vídeo gravado por cliente da rede, ao presenciar um empregado limpando o chão e sendo aparentemente humilhado pela gerente de uma filial da rede

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Divulgação

A empresa Carrefour Comércio e Indústria LTDA. foi condenada, pela 2ª Vara do Trabalho de Campo Grande, ao pagamento de R$ 400 mil pela prática reiterada e habitual de situações caracterizadoras de assédio moral organizacional contra seus empregados, expondo-os a danos de ordem moral. Conforme a sentença, a liquidação desse valor deverá ser realizada de forma solidária pelos dois réus citados no processo, pertencentes ao mesmo grupo econômico.

O montante será revertido ao Fundo de Direitos Difusos, previsto na Lei nº 7.347/85, ou a entidades públicas e privadas sem fins lucrativos, de elevada relevância social, definidas conjuntamente entre a Justiça do Trabalho e o MPT.

Além do pagamento da indenização por dano moral coletivo, o Carrefour também foi condenado ao cumprimento de quatro obrigações de fazer e não fazer, as quais deverão ser observadas em todas as unidades da empresa no estado de Mato Grosso do Sul.

“Os lamentáveis episódios extraídos dos autos claramente configuram o chamado assédio moral organizacional, ‘em que a estrutura hierárquica da empresa tolera práticas de assédio e passa a fazer parte da cultura da empresa’, capaz de reduzirem sobremaneira a dignidade humana dos trabalhadores e ofenderem o valor social do trabalho, fundamentos da República Federativa do Brasil”, sublinhou o juiz Valdir Aparecido Consalter Junior na sentença.

Provas

A ação civil pública ajuizada pelo MPT, em maio deste ano, teve como origem denúncia recebida pela instituição, acompanhada de matéria jornalística que mostra um vídeo gravado por cliente do estabelecimento comercial ao presenciar um empregado limpando o chão e sendo aparentemente humilhado pela gerente da filial localizada no Shopping Campo Grande.

Antes de mover o processo, o MPT instaurou um inquérito civil com a finalidade de apurar as evidências associadas à prática de assédio moral, tendo inclusive apresentado proposta de pactuação de um Termo de Ajuste de Conduta, mas a empresa não manifestou interesse em formalizar o acordo extrajudicial sob o argumento de que não praticava o assédio e teria efetuado a rescisão contratual da gerente que aparece no vídeo, uma semana depois da repercussão do caso nas redes sociais e na imprensa. Entretanto, conforme destacado no inquérito civil, o Carrefour promoveu a recontratação dessa gerente em outra empresa do mesmo grupo econômico, cerca de três meses depois.

Diante da negativa da empresa em firmar o acordo e para que se pudesse aprofundar na investigação da prática de assédio moral, o MPT realizou audiências telepresenciais com empregados e ex-empregados da unidade onde os fatos supostamente ocorreram. O vendedor exibido no vídeo foi um desses empregados ouvidos pelo MPT e contou que passou a ser vítima de chacota entre os colegas e que precisou pedir um afastamento médico, sem ter sido procurado pela empresa em nenhum momento.

No decorrer da investigação, foi identificada a existência de centenas de ações trabalhistas ajuizadas em face do Carrefour nas Varas do Trabalho de Mato Grosso do Sul, muitas delas retratando o histórico de práticas de assédio moral, de agressão verbal, de discriminação e de injúria racial cometidas dentro da empresa, com pedidos de indenização por danos morais.

Ofensas à dignidade humana

Na fundamentação de sua peça processual, o procurador do Trabalho Hiran Sebastião Meneghelli Filho descreve as ações da empresa e de seus prepostos.

“A par dos atos de assédio típicos, como gritos, xingamentos, pressão psicológica, exposição a situações humilhantes etc., há diversas ilicitudes paralelas que encerram um cenário de assédio moral organizacional que vai minando a autoestima, a autoconfiança e a autonomia dos trabalhadores, causando diversos malefícios à saúde física e, principalmente, mental desses empregados, a exemplo de longas jornadas laboradas sem registro de ponto, durante madrugadas inteiras, imposição da prática ilegal de venda casada como forma de valorização e aumento salarial, aumento do volume de trabalho por acúmulo de funções e outras irregularidades”, sustentou Meneghelli Filho.

Liminar

Em junho deste ano, o juiz do Trabalho Valdir Aparecido Consalter Junior reconheceu, em decisão liminar, após a análise de farto acervo probatório que acompanha a ação do MPT, que a empresa tinha como hábito a conduta ilícita de assédio moral, com o intuito deliberado de reduzir seus trabalhadores. E acrescentou que o exercício do poder diretivo de forma abusiva “desvirtua a função social da empresa e viola o direito dos trabalhadores a um meio ambiente de trabalho hígido, além de malferir deveres éticos mais basilares do próprio contrato de trabalho”.

Ao concluir que o Carrefour não teria adotado providência mais enérgica e eficaz com o intuito de eliminar esses comportamentos antijurídicos, o magistrado determinou que a empresa coíba, de imediato, qualquer ato flagrante de assédio moral, com a promoção de apuração e punição dos responsáveis, sob pena de multa no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação.

Além disso, o juiz Valdir Aparecido Consalter Junior ordenou que o Carrefour implemente meios eficazes de recebimento e investigação de denúncias e casos de assédio, com ampla divulgação aos trabalhadores dos canais de denúncias, realização de procedimentos de apuração adequados e escritos, promovendo a efetiva aplicação de punições, sob pena de multa no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação.

O magistrado também impôs ao réu a obrigação de não permitir, tolerar, ignorar ou deixar de agir frente a situações que possam caracterizar assédio moral, autoridade excessiva ou desproporcional, pressão psicológica, coação, intimidação, discriminação, perseguição ou mesmo isolamento e ausência de comunicação direta com o trabalhador assediado, bem como qualquer gesto, palavra, comportamento ou atitude que provoque constrangimento físico ou moral, praticados por parte de seus empregados, diretos ou terceirizados, que detenham poder hierárquico ou mesmo entre colegas de trabalho, sob pena de multa no valor de R$ 10 mil por trabalhador prejudicado e por constatação.

Já na decisão definitiva, proferida em 1º de dezembro, Consalter Junior acrescentou uma quarta obrigação de fazer, a qual consiste na realização de palestra, em até um ano, que aborde e esclareça sobre o tema assédio moral no meio ambiente de trabalho, com a participação de todos os trabalhadores (superiores e subordinados), sob pena de multa no valor de R$ 50 mil.

Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul

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