Atualmente há uma acalorada discussão sobre a liberação da posse ou até do porte de armas de fogo no Brasil, mas o fato de emprestar uma arma, mesmo que legal e de uso permitido para o cidadão, configura-se em crime. Previsto no art. 14 do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003), ceder ou, ainda, emprestar, mesmo que gratuitamente, arma de fogo, pode fazer com que a pessoa seja processada. Foi o que aconteceu com um homem em Mato Grosso do Sul. Nesta semana o caso foi levado para o Tribunal de Justiça, que, por unanimidade, manteve a sentença condenatória de primeiro grau.
O caso chegou à 2ª Câmara Criminal do TJMS, depois de o réu R.F.M. ingressar com uma apelação contra a sentença que o condenou à pena de cinco anos de reclusão, em regime inicialmente semiaberto, e mais 20 dias-multa. Ele foi denunciado por emprestar uma pistola Taurus calibre .380, de seu pai, para um amigo. Além disto, ficou constatado que ele raspou a numeração da arma, em sua versão, sem saber que era crime.
A defesa pleiteou a absolvição do réu, com relação ao crime de emprestar a arma, e a desclassificação da acusação de suprimir a identificação da arma, para o tipo penal do art. 14, com o argumento de que ele incorreu em erro de tipo, ou seja, que efetuou a raspagem da arma imaginando não ser esta uma conduta ilícita.
Segundo consta na denúncia, em depoimento, o réu confirmou o empréstimo da arma para o amigo F.T.M., que posteriormente deflagrou disparos contra um policial civil, fato comprovado no processo. Após o ocorrido, o réu confirmou que fez a raspagem da arma, a pedido de seu amigo e do advogado dele, o que considerou não ser crime.
Em seu voto, o relator do recurso, Des. Jonas Hass Silva Júnior, reiterou que para a caracterização do primeiro crime basta o agente ceder (transferir a posse) ou emprestar (ceder por tempo determinado) a arma de fogo, o que restou demonstrado nos autos, inclusive pela própria confissão do réu.
“Embora o réu realmente não tenha saído de sua residência portando a arma de fogo, ainda assim os fatos apurados refletem a conduta de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, visto que cedeu ou emprestou, de forma livre e consciente, a pistola marca Taurus, calibre .380, para F.T.M, ato que se amolda a um dos núcleos do tipo do art. 14 da Lei nº 10.826/03”, disse o relator.
A tese de desclassificação do delito previsto no art. 16, parágrafo único, I, da Lei nº 10.826/03, para o tipo descrito no art. 14, do mesmo diploma legal, ao argumento de que o réu incorreu em erro de tipo, também não foi aceita pelos desembargadores, pois ele confirmou em depoimento ter raspado a numeração e não há como crer que não tinha conhecimento da ilicitude deste ato.
Os magistrados concordaram com a afirmação do promotor do caso de que “não é crível que o homem médio acredite que suprimir o número de identificação de uma arma de fogo utilizada anteriormente em um crime praticado por terceiro que com ela estava ilegalmente, seja conduta permitida pelo ordenamento jurídico brasileiro”.
Comentários
Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.